Viajando com Arte

O Rio é bem mais do que a Zona Sul – Descobrindo a Cinelândia

Para mim Cinelândia era sinônimo de degrado, uma região central de um Rio de Janeiro onde nunca pensei em colocar meus pés em tantas visitas praianas à Cidade Maravilhosa. Quanta Ignorância a minha, a região pode ter ficado meio abandonada por um tempo mas guarda uma riqueza arquitetônica e histórica impagável e faz pouco renasceu em todo seu esplendor.

Revitalizada para os eventos esportivos que o Rio sediou nos últimos anos, está bem policiada e limpa, então não tem mais desculpa para não conhecer e se encantar com o Centro Antigo do Rio de Janeiro. Aqui um post para quem quer conhecer o Porto Maravilha e seus novos museus. 

De VLT, dá para fazer um passeio por 2 séculos de arte no Rio de Janeiro. Usando o novo meio de transporte da cidade, o Veículo Leve (ou lento como os cariocas chamam)  sobre Trilhos, você pode combinar a ida ao Museu Nacional de Belas Artes, que guarda o maior e mais relevante acervo de arte brasileira do século XIX até o Porto Maravilha para visitar o Museu do Amanhã e ao MAM (Museu de Arte Moderna) que fica no aterro do Flamengo. Senti não ter mais tempo para fazer o trajeto com calma.

Mas vamos à Cinelândia que é o foco deste post. Tudo começou na Praça Floriano com a ideia de transformar a nova região num Times Square tupiniquim.

Com o fim da escravidão e o advento da República no Brasil no fim do século XIX , houve o crescimento de casarios/cortiços e, com isso, o aumento de doenças endêmicas no coração do Rio de Janeiro , a capital do Brasil. Como solução, uma força tarefa se empenhou em educar a população acerca de hábitos de higiene e também foi realizada uma reforma urbana, inspirada na reurbanização de Paris de Georges-Eugène Haussmann. A reforma foi implementada pelo prefeito Pereira Passos para “sanear” a cidade, demolindo a imagem de um Rio colonial. Inaugurada em 1905, a avenida Central (hoje Rio Branco) tornou-se o grande símbolo da reforma.

A ideia era construir uma grande avenida e um largo com dezenas de bares, cinemas, teatros, criando uma Cinelândia, ou seja, “cidade dos cinemas”. No seu apogeu contava com 12 casas de espetáculo. Foi nesta época, quando os cortiços centrais foram demolidos que a população migrou para a periferia e subiu o morro , começando as primeiras favelas.

O entorno da Praça Floriano é marcado por imponentes construções nos estilos Eclético , Neoclássico, Art Nouveau e Art Déco. Um mix de estilos característicos do inicio do seculo XX. São museus, teatros e centros culturais formando um complexo impressionante e rico como poucos. No meio da praça é difícil escolher para qual direção olhar , a sensação é de estar numa cidade européia como Madri ou Paris.

Em estilo eclético, 0 prédio do Theatro Municipal é o mais imponente. Tudo é glamour , inaugurado em 1909, ao longo da sua existência passou por quatro reformas, sendo a última, em 2008 capitaneado com esmero pela atriz Carla Camuratti. Minha primeira tentativa de visita foi frustrada, compramos o ingresso para dali duas horas e acabamos chegando atrasadas, resultado! A visita tem que ser guiada e não se pode entrar depois do horário marcado, que é britânico e não carioca.

Mas valeu a volta em outro dia , por dentro ele é ainda mais luxuoso e surpreendente do que por fora. São detalhes em ferro fundido, espelhos e cerâmica numa mistura que gera harmonia.

Inicialmente, o teatro funcionava apenas como uma casa de espetáculos, recebendo companhias estrangeiras. A partir da década de 30, passou a ter seu próprio corpo artístico, com coro, orquestra e ballet que continuam em plena atividade até hoje, realizando várias produções próprias durante o ano.

A escadaria central é imponente e leva a sala de espetáculos com 2.244 assentos. Como é um teatro vivo , assistimos a um ensaio de orquestra. Deu vontade de ficar para o espetáculo. Descendo as escadas laterais chega-se ao salão Assyrio que antigamente funcionava como restaurante do teatro. Por motivos de segurança, o local funciona hoje apenas como sala de espera.Para conhecer o Municipal tem que fazer uma visita guiada ou assistir a um espetáculo, o que confesso fiquei babando.

O Museu Nacional de Belas Artes é a casa de obras icônicas da arte brasileira do século XIX e XX. Ano passado fez um projeto bárbaro que buscava trazer os jovens para dentro do museu, o projeto chamava-se “Hashtag da Arte”.

Reparem neste quadro abaixo os monges em uma varanda no Rio Colonial e os hashtags #solnalaje e #rooftop que trazem a cena para o contexto atual.

O brasileiro é um dos campeões em tempo conectado à internet. Ao mesmo tempo, é um dos povos que menos frequenta exposições de arte: apenas 7,5% da população tem como hábito visitar museus. Como então tornar as obras atrativas para esta população que vive com os olhos presos à tela do celular.

A estratégia deu certo , as postagens aumentarama afluência de jovens querendo ver ao vivo o que o Instagram apresentava com hashtags divertidas e atuais. Desta maneira, uma peça de 1817 que mostra o Dom João VI posando com seu traje bordado a ouro, ganhou as hashtags #lookdodia, #reidocamarote, #ostentação, entre outras.

Além das obras de pintura o Museu ainda tem a ala das esculturas com cópias de obras clássicas e alguns artistas brasileiros como Rodolfo Bernardelli e Victor Brecheret.

O Centro Cultural da Justiça Federal (CCJF) também apresenta o estilo Eclético.Além do salão de sessões, hoje aberto para visitação, possui salas de exposições, teatro, cinema, lojinha e um café. Na sala principal , julgamentos históricos foram perpetrados, como da famosa Olga Benário.

Logo na entrada há uma escada de ferro fundido em estilo Art Noveau que é coroada com um grande vitral com a justiça retratada.

Câmara de Vereadores ou Palácio Pedro Ernesto, é um prédio lindo em estilo Eclético de 1923. Seu interior é austero , a Sala Inglesa é toda revestida em madeira de lei. 

Chamou a atenção no começo da visita, a sala de trabalho dos funcionários da Câmara onde uma TV ligada no programa da Fátima Bernardes “distraía” os servidores que marcavam ponto no local. Só faltaram nos perguntaram o que queríamos , já que estávamos atrapalhando o serviço! 

O Palácio recebeu o apelido de “Gaiola de Ouro” do historiador Brasil Gérson, devido ao altíssimo custo de sua construção: mais de duas vezes o custo da obra do Teatro Municipal . A prática não é novidade!

Na mesma Praça Floriano , um exemplo de construção em estilo Neoclássico é a Biblioteca Nacional. Um tesouro que guarda exemplares de nosso acervo literário mais precioso.

Entre suas várias responsabilidades incluem-se a de preservar, atualizar e divulgar uma coleção com mais de nove milhões de peças, que teve início com a chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil fugindo do cerco de Napoleão Bonaparte a Portugal em 1808. Até 1814, apenas os estudiosos podiam consultar a biblioteca e, mesmo assim, mediante autorização régia. Depois dessa data, o acesso foi liberado ao público e hoje os livros podem ser consultados , mas não retirados do local. O prédio contém ornamentos de artistas como Eliseu Visconti, Irmãos Bernardelli e Rodolfo Amoedo. Os mais renomados brasileiros do início do século XX.

Chega a cansar de ver tantas maravilhas concentradas, são 5 prédios imperdíveis e muito bem restaurados num espaço de poucos metros, programa para um turno bem completo de imersão na nossa história.

Para finalizar dois exemplares em estilo Art Decô, o edifício Wolfgang Amadeus Mozart, conhecido popularmente como Amarelinho e o Teatro Odeon.