Viajando com Arte

Islândia, um verão onde o sol nunca se põe

Inspirada pelo livro “Desumanização” do português Valter Hugo Mãe escrevo este relato na volta de uma viagem que foi além do turismo,  uma experiência de convivência e comunhão com a natureza. 

Thingvellir – encontro das placas tectônicas da América e Europa

Partindo da ideia de que o pais é vasto , repleto de vazios com uma população de pouco mais de trezentas mil almas concentradas em duas cidades, programei uma aventura de motorhome, para sair do conforto em todos os sentidos e aproveitar a paisagem ao máximo. Marinheiros de primeira viagem no quesito camping não nos apertamos e soubemos tirar proveito de todas as possibilidades da nossa casa/carro, que nos permitia  viajar até que o cansaço nos vencesse e  um camping surgisse no horizonte.

Quando fomos retirar o motorhome, qualquer um via que éramos totalmente crus no tema. Não sabíamos como colocar água limpa, retirar água usada, limpar o banheiro e evidentemente nunca tínhamos dirigido um motorhome. Oito dias de plena convivência nos aguardavam.

Dormíamos muito próximos, apesar de terem três camas separadas. Usamos banheiros coletivos dos campings, esquecemos calcinhas e shampoos pelos caminhos mas sobretudo exercitamos o coletivo , o companheirismo e a generosidade. Nos emprestaram churrasqueira elétrica e nos ensinaram que acampar é interação e parceria acima de tudo.

Em menos de sete dias demos a volta inteira na ilha , exploramos todos os tipos de paisagens e perto de uma centena de cachoeiras nos 1500km rodados. Muitas vezes não são além de fios de água que correm para onde quer que olhemos, como se fosse o lamento da terra, um choro profundo que umedece os campos e o olhar. Outras vezes são águas caudalosas que causam temor , a proximidade pode nos sugar com sua força telúrica.

 Islândia tem temperamento, as intempéries vem sem avisar, o tempo muda e a temperatura oscila em poucas horas. No verão o sol se põe depois da meia-noite mas a claridade nunca desaparece. Um dia eterno que nos rodeia com por do sol prolongado por horas! Hipnótico

As águas das geleiras e o fogo dos vulcões brotam de dentro da terra. Geyser foi uma palavra originada aqui. As pessoas respeitam a natureza como um ser superior que determina seus destinos. Os fiordes longínquos só são alcançados em veículos especiais , assim como o interior da ilha. Nos mantivemos no círculo da estrada principal , mas me encantou especialmente a costa sul , com uma variedade de paisagens que vai de enormes glaciares e lagoas de icebergs desaguando no mar, até praias de areias negras.

Vik , uma pequena vilinha no sul famosa pela sua capelinha com lupinas!

Os animais são a antítese da terra, são dóceis as ovelhas espalhadas pelos campos, belíssimos os cavalos fortes e crinudos , o mar é como um aquário de cada morador e o tubarão uma iguaria para ser degustada com pão doce. Os campos de lupinas, flor estrangeira que se adaptou ao solo duro e aos ventos gelados, hoje tinge de azul  as pradarias no início do verão, um privilégio que nós tivemos durante todo o percurso , nos obrigando a parar diversas vezes para fotos.

A Islândia é um sonho , uma terra por cumprir seu destino, como se nada houvesse além! Esvaziada de árvores ela é vasta e devastada pelos ventos do norte. Na segunda maior cidade Akurery, capital do norte, os fiordes captam as mensagens e enterram a cabeça no mar.

Uma região que fica totalmente isolada no inverno é o pequeno porto de Fljótsdalshérað . Me lembrou do seriado “Trapped”  que se passa por lá quando uma nevasca isola uma aldeia do resto do mundo. E a catástrofe acontece bem quando o corpo de uma vítima de assassinato aparece às margens do fjord.

Próximo dali está o Lago Myvatn, que quer dizer mosquito e faz jus ao nome. Enxames de insetos nos espantaram de descobrir mais de sua região vulcânica e cenário lunar. Mas o que vimos já foi suficiente para deixar uma imagem indelével.

Lago Myvatn

A tristeza abnegada de ali viver deixa os islandeses benzidos de paisagens. Uma gente sozinha por valentia, que cria as memórias de poucas almas. Akureyri é a segunda maior cidade, um misto de modernidade e vazios à beira de um enorme fiorde, vive da pesca, passeios para ver baleias e de suas lendas de gnomos.

No final, já na capital Reykjavík tentamos sintetizar nossa vivência e para mim fica uma sensação de que com este povo há uma verdade intrínseca que não é atingida pelos de fora. Eu voltaria muitas vezes , até para sentir a profunda força do inverno e ver a aurora boreal , que poderia quem sabe , desvendar mais destas terras.

O bônus desta aventura foi viajar com o filho, aproveitem sempre estas oportunidades, impagável!

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